Reflexões teóricas sobre Grupos e Conflitos Organizacionais

Introdução

Segundo Fela Moscovici (1980), as pessoas percebem, pensam, sentem e agem de maneiras distintas. Nessas percepções singulares é que surge o conflito: à medida que essas diferenças comportamentais precisam ser enfrentadas. Elas não podem ser consideradas boas ou más, pois propiciam riqueza de possibilidades, opções de maneiras de reagir a situações e problemas.

Em grupos de trabalhos as discordâncias podem conduzir a discussões, tensões, insatisfações e conflito aberto, ativando sentimentos e emoções, transformando o clima emocional do grupo.

A globalização e as profundas mudanças que vêm ocorrendo nas empresas, tais como novas técnicas de gerenciamento, controle de qualidade, Just in Time, terceirização, etc, estão cada vez mais intensificando a competição entre os indivíduos nas organizações e têm aumentado o nível de stress e suas consequências maléficas: infarto, derrame cerebral, câncer e ao mesmo tempo gerando uma significativa queda na qualidade de vida no trabalho.

Conceito

Existem diversos conceitos de conflitos. Segundo Baron(1994),“ refere-se a instâncias nas quais unidades ou indivíduos na organização trabalham contra, no entanto com os outros ”. Walton(1972), diz que, “ conflitos representam antagonismos pessoais, diferenças de caráter marcadamente pessoal e emocional, decorrentes das relações de interdependência dos indivíduos no trabalho ”. Esses antagonismos tendem a se agravar em um ambiente corporativo, onde pessoas com valores diferentes interagem.

Bowditch(1992), fala que “ conflito intergrupal representa divergências ou discordâncias entre grupos quanto à autoridade, metas, territórios ou recursos e em certos sentidos, são inevitáveis nas organizações”.

Pessoas e grupos são interdependentes nas organizações, onde três processos determinam a coordenação: comportamento pró-social (ajuda), cooperação mútua entre indivíduos e grupos e grupos e conflitos, ou seja, ações de indivíduos ou grupos com efeitos percebidos como negativos. As diferenças individuais podem surgir, a partir de valores, considerações morais quanto ao exercício do poder e concepção sobre justiça, eqüidade e julgamentos éticos e afetam consideravelmente uma seleção de objetivos e métodos.

Os conflitos interpessoais são cíclicos e dinâmicos e envolvem quatro elementos básicos: problemas, eventos, atitudes de intensificação ou pacificação e conseqüências.

O processo do conflito

Segundo Robbins(1994), o processo do conflito pode ser dividido em cinco estágios. No primeiro estágio, chamado oposição ou incompatibilidade potencial são analisadas todas as condições antecedentes ao conflito. Esses antecedentes podem estar nas dificuldades ou bloqueios nos canais de comunicação da empresa, bem como na própria estrutura corporativa, podendo existir ambigüidade na definição das responsabilidades de ações ou mesmo diferentes metas pessoais nos grupos de trabalho, em confronto com os objetivos corporativos. Nessa fase, também é importante avaliar as variáveis pessoais existentes no conflito, bem como a falta de empatia dos componentes do grupo.

Num segundo estágio avalia-se a cognição e personalização do conflito. Quando ele não está personalizado, existe o conflito percebido. Quando os indivíduos tornam-se emocionalmente envolvidos com o mesmo, existe o conflito sentido, e é este o início propriamente dito de um conflito.

No estágio três, ficam definidas as intenções de se lidar com o conflito, ou seja, as decisões de agir de uma dada maneira.

Na competição, se satisfaz os seus próprios interesses, sem se levar em conta os impactos causados em terceiros, enquanto que, na colaboração, ambas as partes desejam satisfazer seus interesses

Quando há um compromisso, não se pode dizer que haverá um vencedor. Claro, cada parte desiste de algo em função de um objetivo comum. Também existe a evitação, onde ignoram-se o conflito e a discussão. Em último caso, pode-se observar que existe uma acomodação, onde se coloca os interesses da outra parte acima dos seus próprios interesses, perdoando qualquer infração cometida.

Num estágio do comportamento, onde o conflito se torna visível, pode-se perceber declarações, ações e reações em conflito. O grau do conflito pode variar de um nível de divergências enriquecedoras até a um nível altamente destrutivo.

Quanto a resultado de conflito em grupo eles existem a dois níveis. Pode ser funcional, quando ele melhora a qualidade das decisões, estimulando e criando um ambiente de auto-avaliação e mudanças. Pode-se dizer que o conflito de resultado funcional está ligado positivamente à produtividade.

Em um segundo nível ele pode ser disfuncional levando à eficácia ou até mesmo à destruição do grupo.

Existem alguns impedimentos para que não haja a declaração de um conflito: exigências de trabalho (tempo), normas de grupo, conceitos pessoais em relação a papéis, e o receio que uma atitude conciliatória não seja recíproca, etc.

Como lidar com o conflito

A maneira pela qual lidamos com um conflito depende da natureza, razões subjacentes, grau de extensão, intensidade ou importância quanto a conseqüências, contexto grupal e organizacional e motivação dos oponentes. Depende também de experiências que cada indivíduo envolvido no conflito teve em relação a outros conflitos e resultados anteriores.

Segundo Tannenbaum(1972), existem quatro abordagens para se lidar com o conflito. A primeira seria evitá-lo, manipulando a composição de grupos homogêneos, onde o líder pode exercer o controle sobre relações interpessoais dos liderados, alterando condições ambientais físicas e psicológicas.

Nesse caso corre-se o risco da redução ou extinção da criatividade, quando velhas idéias não são reexaminadas para não ferir normas de solidariedade grupal.

Ao reprimir o conflito, o líder pode recompensar os componentes do grupo para a concordância e cooperação pela aceitação das normas vigentes ou punir discordâncias para a harmonia do grupo ou organização.

Como vantagens nessa abordagem, temos o alcance de objetivos importantes a curto prazo, mas a repressão tem um custo em termos psicológicos. Com o aguçamento das divergências do conflito o líder reconhece e as aceita, porém procura criar uma situação aberta para a expressão do conflito. A vantagem desse procedimento seria o esclarecimento dos fatos e a aprendizagem com o processo, mas os riscos são grandes, com custos financeiros, psicológicos e com desperdícios de energia e tempo.

A última etapa seria a de transformar diferenças em resolução de problemas onde utiliza-se divergências enriquecedoras com situações conflitivas que devem ser resolvidas cooperativa e criativamente.

As vantagens dessa abordagem seriam ajudar a lidar com sentimentos de discordâncias (frustração, ressentimento, hostilidade), evitar explosão de sentimentos e canalizar energia para atividades construtivas. Essa abordagem demanda tempo e habilidade do líder e membros do grupo.

O processo de negociação (barganha)

Em todo processo de negociação, segundo Robbins, existem cinco fases distintas: a primeira seria a preparação e o planejamento da negociação, onde deve-se analisar a natureza do conflito, quem está envolvido, quais as percepções pessoais dos envolvidos e quais as metas do grupo.

Em um segundo momento, é importante que se defina as regras básicas em questões, tais como: quem fará a negociação; onde ela acontecerá; e, no caso de impasse, qual será o procedimento a ser adotado.

Na fase de esclarecimento e justificação existe a oportunidade para educar e informar a cada parte, as questões a serem tratadas, sem que haja nesse momento a confrontação.

A fase decisiva para a solução do problema está na barganha. Ela é a essência de todo o processo de negociação, onde concessões devem ser feitas por ambas as partes nas soluções dos impasses.

Todo o processo de negociação finaliza com o fechamento e formalização do acordo, que pode ser feito de várias formas, desde um aperto de mão até um contrato formal.

Quando se trata de negociação, não existem evidências de que a personalidade dos indivíduos interfira diretamente na negociação, o foco deve estar concentrado nas questões e não na personalidade dos oponentes. Não existem também diferenças evidentes de sexo nas negociações, embora por questões culturais, as mulheres se sentem menos satisfeitas com o seu desempenho ao final do processo, e se penalizam excessivamente quando fracassam.

Existem sim, diferenças culturais em negociações. A formação cultural é relevante e os estudos de negociação variam através das culturas.

Os japoneses ao negociar são mais metódicos, enquanto que os norte-americanos são mais práticos e objetivos. Já os árabes levam a negociação para o lado emocional e os brasileiros utilizam sempre toques de mãos e tendem quase sempre a levar as questões para os extremos.

Em um tratamento de conflito pode-se ter a solução total do mesmo, ou seja, a eliminação completa das divergências, dos antagonismos originais ou o controle do conflito, onde há uma redução de suas conseqüências negativas, persistindo as preferências contrárias ou os antagonismos.

Quando há uma necessidade de decisão ou solução rápida de um conflito, pode ser mais fácil e prático ignorar divergências e uma opção forçada é tomada muitas vezes, por ser uma solução prática e não a mais válida ou a melhor.

Em um conflito intergrupal as dimensões das intenções dos grupos de conflito podem ser de cooperação onde há a satisfação de desejos do outro grupo ou de assertividade, com a satisfação de desejos do próprio grupo.

Os não-conformados às normas são rejeitados, o que traz ansiedade, leva à recuperação de aceitação e afeto pelo conformismo obsessivo.

Padrões vigentes podem e devem ser desafiados de forma criativa, buscando solução de problemas. O conformismo é válido para grupo, pois busca soluções inovadoras e criativas.

A terceira solucionadora em um conflito

A terceira parte envolvida como solucionadora em um conflito tem um papel ainda não institucionalizado nas organizações.

Ela pode estar relacionada a uma forma particular de consultoria de procedimentos, onde as atividades exercidas auxiliam o cliente a reconhecer, compreender e reagir a eventos registrados em seu meio de interação pessoal, que se constituem em um ramo da socioterapia.

A terceira parte no conflito possui funções estratégicas tais como: verificação da motivação mútua para redução do conflito, garantia do equilíbrio de poderes, evitação de confrontações prematuras, assegurar que a fase de diferenciação do diálogo seja inteiramente desenvolvida antes de passar para a fase de integração, assegurar condições favoráveis à abertura do diálogo, garantia de meios apropriados de comunicação e esforço para alcançar um ótimo nível de tensão no sistema interpessoal, elevando-o ou reduzindo-o conforme a situação.

Os terceiros negociadores podem ser do tipo mediador, quando ele é neutro e facilita uma negociação; quando é árbitro, ele usa sua autoridade; quando conciliador, funciona como um elo de ligação confiável. O terceiro consultor é aquele que traz a solução através de análise e melhora a relação dos conflitantes.

Os solucionadores criativos do conflito devem ter como características a inteligência acima da média, ter se exposto a experiências diversificadas, interesses por idéias e suas combinações, habilidade de jogar com idéias, capacidade de fazer associações remotas, receptividade a metáforas e analogias, preferências pelo novo e complexo e independência no julgamento, recebendo influência de condições sociais.

Fatores que afetam as relações comportamentais entre grupos

O sucesso nas relações entre grupos está diretamente ligado à sua coordenação.

É preciso avaliar o grau de interdependência de um grupo para se projetar o seu índice de sucesso, bem como avaliar em que tipo de tarefa está envolvido. Tarefas não rotineiras requerem um número maior de processamento de informações ao passo que tarefas rotineiras exigem pouco.

A percepção varia de acordo com o tempo do grupo e sua orientação ao objetivo (foco). Tarefas de produção requerem metas e tempo curtos, ao passo que pesquisas demandam tempo e prazos longos.

Confrontação implica numa discussão direta ou indireta entre as partes e aumenta o comprometimento mútuo, é preciso neste momento diagnosticar as causas do conflito, descobrir e aplicar procedimento para diminuir a gravidade do conflito. É um estágio potencialmente útil para a pacificação total ou para o controle do conflito.

Métodos para administrar relações entre grupos e conflitos

Existem vários pontos a se observar na administração das relações entre grupos. A primeira questão é a colocação de regras e procedimentos, onde se avalia como os membros do grupo vão interagir. O próximo ponto a se verificar seria o da hierarquia, momento no qual leva-se ao superior o conflito para a resolução.

Não se pode administrar relações entre grupos e conflitos, sem que haja um planejamento, onde metas específicas são definidas bem como a área de responsabilidade de cada indivíduo.

Existe também a necessidade de pessoas especializadas nas duas áreas de conflitos que falem a linguagem de ambos na negociação. Nesse caso podem entrar em ação as famosas forças-tarefas, ou seja, grupos temporários para se resolver problemas (apaga incêndio).

Quando todos esses mecanismos de coordenação prévios não funcionam mais, surgem equipes permanentes integrando departamentos ou ainda departamentos permanentes que administram conflitos a longo prazo.

Conclusão

A habilidade de administrar e resolver conflitos constitui um dos componentes cruciais da competência interpessoal e sugere necessidade de maior atenção e investimento em treinamento para desempenho eficaz e maior produtividade individual e grupal.

O conflito funciona como raiz de mudanças pessoais, grupais e sociais, além de prevenir estagnação, estimula o interesse e a curiosidade, descobre problemas, demanda soluções e mobiliza relações.

Para se tratar conflitos é necessário levar em conta diversas tendências pessoais como: inibições para demonstrar sentimentos, exigência de uma energia emocional para enfrentar ou resolver um conflito e a consideração de riscos associados a conflitos organizacionais.

Como efeitos negativos de um conflito podemos destacar: interferências na comunicação, eliminação de coordenação grupal, necessidade de maior esforço para atingir metas, estilo autoritário de liderança, estereótipos negativos de membros e disputas intergrupais.

Quando bem conduzidos, os conflitos podem ser positivos, gerando a abertura de problemas ignorados, possibilitando novas idéias e estimulando a motivação, performance e produtividade.

Enfim, podemos afirmar que conflitos existem e sempre existirão em todos os grupos. A maneira pela qual se conduzir e se observar um conflito é fundamental para que ele seja funcional ou disfuncional.

Conflitos organizacionais são saudáveis e devem ser estimulados e controlados em níveis desejáveis para que haja o surgimento de novas idéias, o estímulo de motivação e o aumento da produtividade.

Por:
Pedro Fausto Glanzmann

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